quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Em segredo te contarei, minha vida; que é como chuva que chega que eu me abro toda azul a te receber. E me ilumino toda, e te admiro todo, e te peço tanto, mas tanto; que até confundo as palavras. Eu te dei o melhor de mim, e te cuidei e te amei. Ah, que história bonita eu teria pra contar; mas acontece que dia desses eu dormi com um desconhecido numa cama tão pequena, que eu tive que abraçá-lo bem forte, e eu pude te sentir em cada milímetro do meu corpo. Você, amor; no corpo de um desconhecido qualquer. E hoje já não me importa mais que você venha ou não, eu sempre vou te ter por perto numa fotografia qualquer, num porre de vodka ou num desses carros vermelhos que passam na rua.
Se eu pudesse, eu desfazia cada letra de cada texto de cada noite de cada cada, eu desfazia toda essa especificidade mesquinha e medíocre e transformava em estrelas brilhantes e dissimuladas a iluminar as putas da Amaral Peixoto, os travestis da 21.
Agora já é tarde, já tirei os saltos e desfiz a maquiagem; mas amanhã começa tudo de novo. E se por acaso você me encontrar por aí, não te escondas, meu amor. Se achegue bem pertinho e me diga que não sente falta, mas que sim, faz tempo.
Hoje eu vou escrever copiosamente uma infinidade de textos. São duas da manhã, eu já fumei alguns cigarros e estou pensando seriamente em beber um pouco pra tentar dormir. Já pensei em te ligar, faz tempo que não ouço a tua voz. E logo ontem, que eu estava tão feliz. Incrível essa vulnerabilidade, e mais incrível ainda a forma como eu associo tudo isso a você. Eu queria que você voltasse, eu queria que você fosse quem de facto você não é.
Eu desacostumei a ficar sozinha, e já não consigo me desligar desse vínculo imaginário que me liga a você. O tempo continua passando, e lá fora continua escuro porque é madrugada. Drummond, Chico Buarque, Betânia. E o sono que não chega? Clarice, Jabor. Outro cigarro, fumo a metade. E foi exatamente nesse quarto, nesse quarto ingrato, que você plantou uma erva daninha danada que não pára de crescer, não pára, não pára, não pára. Não cessa, e não cessa de não cessar, e você ainda não veio.
e quando eu me vi eu já estava lá, amalgamada nos teus braços, ouvindo o teu silêncio e concordando com qualquer besteira que você dissesse. E depois tudo virou um turbilhão de "se" , se a gente tivesse tentado, se a gente não tivesse dito, se a gente quisesse, se fosse diferente. se se se se, e a maré subiu e a gente não procurou uma praia, a gente se perdeu meu amor, sem que a minha mão pudesse segurar a tua mão tão bonita, sem que houvesse tempo para declamar qualquer palavra de amor.
E eu queria tanto.. eu não soube ao certo em que momento eu decidi ser tua, e também não sei precisar quando é que você viu que eu não era aquilo que te bastava; mas eu queria mesmo era saber como mesmo com tudo isso cintilando aos meus olhos, eu não pude ver que os nossos corpos se afastavam e os meus braços continuavam abertos a te receber. Me diz quando você volta, me diz se por acaso você volta,faz tempo; faz falta.
Faz tempo que eu não te vejo, e durante muito tempo esse tempo foi uma eternidade, não acabava nunca, nem depois de muito álcool. E eu sinceramente não sei dizer o que será de mim da próxima vez que os teus olhos encontrarem os meus. Hoje eu caminhei a praia inteira, e já fiz milhões de outras coisas pra ver se esse dia acabava logo, pra ver se você ia embora de vez.
Alguns dias eu esqueço da tua pregnância na minha vida, e te entrego tão doces as palavras que eu guardei, te dedico em segredo um mundo todo lindo que eu desenhei pra você, minha vida.
Eu preciso muito de você, e preciso agora; e tenho muito medo de te encontrar de novo e enfraquecer; afinal já faz tempo que a minha certeza jaz serena no jardim e eu oscilo entre aceitar ou não o teu querer tanto quanto difuso, obtuso e protuberante, cortante, angustiante, lancinante.
Se a gente tivesse tempo, eu te diria um milhão de coisas que se perderam na imensidão das tuas falhas, e outras tantas que permaneceram intactas nos teus terremotos sentimentais. Se você me deixasse, eu poderia ser a tua festa, o teu carnaval; o teu velório, o teu jardim.
E se eu dissesse que ainda é tempo, e que a gente poderia?!

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Eu nunca lhe contei; mas sim, eu já lhe traí. Uma, duas, três, quatro, e dezenas de vezes. E tal como disse Arnaldo Jabor, a Suzane von Ritchthofen matou os pais na tentativa de sentir alguma culpa através de tamanha atrocidade. E eu, meu amor, te traí pra ver se assim eu me traía, pra tentar mostrar a mim mesma que havia em mim algum resquício de amor próprio, algo de especular que me fizesse capaz de viver sem você, longe da tua sombra. Eu queria ser suficientemente minha para que então te entregasse o melhor de mim, e assim eu seria integralmente tua.
E cada homem que se deitou em nossa cama, eu rezava pra sentir alguma coisa; repulsa, vergonha, nojo, desprazer. Queria poder ver na face alheia as tuas feições tão bonitas, e então sentir saudade ou qualquer coisa do gênero. Mas não, eu não presto, eu não presto. E gostei, e gozei. E nesse pecado do adultério fui te amando cada vez mais, e quanto mais eu me afastava de você nesse sacrilégio, mais eu te idolatrava, e te santificava; e me certificava de que não, longe de você não havia vida, havia somente um corpo nu, um aventura noturna, um desejo, uma demanda.
Mas com você, meu amor; eu podia viver, e criar um mundo todo novo com suas mentiras tão sinceras, tomando todo o cuidado do mundo para que eu acreditasse na leviandade de um sentimento teu. Eu te amo, eu te amo, e preciso que você saiba que sim, que eu te traí, e que por isso mesmo eu te amo ainda mais, por saber que você está acima de tudo isso, acima de qualquer capricho ou vaidade.
E o que significa confiança perto desse tanto de amor que eu sinto por você, minha vida? É indubitável, irrefutável essa certeza de que eu serei somente tua, mesmo com tantos homens penetrando os meus vazios, mesmo com tantos corpos habitando a minha cama por uma noite ou duas.
E acho inclusive que o fato de eu me portar tal como uma cortesã barata, lhe é útil para que no fim de cada noite, eu tenha a sensação de que você ocupa um locus intransponível, insubstituível na minha cama, na minha casa, na minha vida, nesse mundo tão delicado que eu criei para vivermos em paz.
E se algum dia você errou, repito Nelson Rodrigues : "Perdoa-me por me traíres", meu bem.
Já se passaram tantos dias, tantas horas; e eu não me dei conta desse caminho que agora eu trilho sozinha. Passo o tempo alheia a qualquer coisa que acontece, e assim o tempo vai passando com essa tênue fluidez, como se eu já não exercesse controle algum sobre isso que chamam de corpo, sobre isso que chamam de vida.
Hoje mesmo já li Pessoa, Caio, Maithê Proença, Clarice e Cecília, e assim o céu foi escurecendo e eu fui me dirigindo pra isso que chamam de diaseguinte. Dia seguinte a que?! Eu ainda não vivi o dia anterior, ainda não sepultei em cova rasa esse passado necrosado que insiste em retornar.
Já perdi a práxis na escrita, e sinto que as minhas habilidades vêm se atrofiando. Já não tenho medo, e não sinto dor, e já escrevi tanto que gastei tudo o que eu havia de sentir. Perco um dia inteiro tentando ganhar alguma coisa que me salve da virtualidade dessa escrita que me ressuscita, desse amontoado de palavras que me leva à redenção.
Não tenho paciência pra muita coisa, e como quem escala uma montanha eu vou vivendo, sorvendo goles quentes dessa ingratidão e esgrimindo com essa mulher que me entope de inteligência e livros e filmes e textos, e não vive, e não arrisca, e erra tanto, coitada.
A verdade é que eu sinto falta; "Il y a toujours qulque chose d'abient qui me tourmente", Caio cita Camille Claudel num texto qualquer. E muita coisa me falta, inclusive a própria falta.
Acho que é por isso que eu tenho essa necessidade absurda de me envolver nos submundos das realidades, e de psicoticamente cravar em mim traços que me vitimizem, de forma que eu possa sentir isso que os neuróticos adoram, e assim me regojizar nesse leito do mais-de-gozar. E eu não acho, não acho, não acho.
Eu procuro um coitado qualquer e o coloco no mais alto patamar do meu coração, e então projeto nele tudo isso que eu sou, e fecho os olhos para todas as imperfeições que ele jamais ousaria ter, e aí pronto, nasce uma projeção de mim mesma, um apêndice do meu próprio corpo, e parece até que já vivemos juntos desde sempre, e que pelo simples fato de eu tê-lo escolhido, ele já tivesse pré determinado a me amar. Mas geralmente é só sexo, ou um relacionamento já fadado ao fracasso. E então esse apêndice inflama, numa apendicite que dói, dói e dói; e aí é preciso uma incisão cirúrgica, e esse pedaço de mim me é retirado sem a minha permissão. Oh pedaço de mim, oh metade amputada de mim, leva o que há de mim.. E leva. Leva tudo o que há de mim. E então eu tenho que me reinventar, e procurar outra forma de projetar tudo isso que eu preciso pra viver. E faz falta, muita falta.
Seis e meia,meu Deus; preciso de café.

domingo, 2 de agosto de 2009

Eu queria mesmo que você fosse um lugar pra que eu pudesse voltar. Um lugar seguro para o qual eu regressaria sempre que o mundo me parecesse cruel demais; inconcebível demais. E eu teria você para dividir esse peso maciço que por vezes me cansa por demais.
Queria mesmo,amor;que você estivesse lá pra quando eu mais precisasse. Mas agora já passa da meia noite, e você ainda não voltou pra essa casa cheia de lembranças e saudades. E eu gasto as minhas horas pensando em como seria se eu não tivesse me precipitado tanto, se eu tivesse me permitido mais, se eu não tivesse te amado tanto. Eu te prometi milhões de coisas que eu jamais cumpriria se não fosse toda essa tua falsa complacência, se não fosse toda essa tua dureza parado na porto sem ir embora, e sem permanecer. Permanecer,até amanhecer, meu amor. Fica mais um pouco enquanto ainda é cedo, e então eu poderei te dizer tudo o que me aflige, e você com toda a tua hombridade que me fere me protegerá desse mal que eu inventei só pra te ter por perto.
Se a gente não tivesse dito tanta coisa, se a gente não tivesse feito tanta coisa. Agora já é muito tarde, e eu continuo formulando hipóteses que justifiquem a sua partida, que justifiquem tudo isso que nunca aconteceu. E eu não consigo achar aquilo que nós jamais perdemos, aquilo que nunca nos pertenceu, aquele instante em que sem perceber, você escapou por entre todos os atalhos que eu percorri pra te encontrar. E agora já passa da meia noite,meu Deus; e eu ainda tenho uma madrugada inteira pra encaixar nessa associação livre um lugar pra repousar a minha incompetência.
E onde andará você agora,minha vida?Um dia você volta; deixa eu te sentir,só um pouco. é, um dia você volta, parce que je suis ici. Encore, et pour toujours,mon petit.